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Hurricane Florence from international space station
Em breve, poderá ser possível reduzir a intensidade de ciclones pulverizando partículas na atmosfera acima de uma tempestade em formação. Mas os altos custos e a própria marcha acelerada do aquecimento global não facilitarão esse trabalho. NASA, CC BY

Clima: é possível eliminar os furacões? Sim, mas ainda falta muita pesquisa - e muito dinheiro

O planeta observa: no litoral da China, gente fugindo de sucessivos tufões. Nas Filipinas, partes do arquipélago foram recentemente inundadas. A cada ano, vemos crescer o volume de formação de tufões - as tempestades circulares intensas que, dependendo da região, são chamadas também de ciclones tropicais ou furacões.

Mesmo com a queda drástica do número de mortes causadas por estes eventos desde os anos 1970, os danos causados pelos ciclones aumentaram sete vezes de lá para cá. Só na década de 2010, o prejuízo total no mundo superou os US$500 bilhões de dólares.

Por quê? Porque os oceanos e a atmosfera do nosso planeta estão mais quentes, o que pode potencializar os ciclones. Um ciclone tropical, furacão ou tufão é um motor térmico, que transfere calor do oceano para as camadas mais frias da atmosfera. Mais calor no sistema significa motores de calor mais intensos.

Não é de se admirar que experimentos sobre o controle do clima durante a Guerra Fria voltem a interessar. Embora os primeiros esforços tenham tido pouco sucesso, nossa nova pesquisa avalia outros métodos para enfraquecer as tempestades, bombeando água fria das profundezas ou espalhando partículas na atmosfera baixa para reduzir o calor e incentivar a precipitação de chuvas. Mas essas técnicas podem ter efeitos colaterais inesperados –ou até mesmo perigosos.

woman after typhoon China
Com vida, mas sem casa: moradora do vilarejo de Nanxinfang, devastado por enchentes nos arredores de Pequim. Ng Han Guan.AP

Por que a ciência está de olho no furacão?

Os ciclones tropicais são letais. Em 1970, o ciclone mais devastador da história atingiu Bangladesh (na época, Paquistão Oriental). Os meteorologistas sabiam que ele estava chegando, mas não tinham como avisar as áreas previstas na rota do tufão. Cerca de 500.000 pessoas morreram na tragédia.

Desde então, investimos em sistemas de alerta precoce muito melhores. As mortes caíram substancialmente agora que as pessoas podem evacuar a zona com tempo.

Mas ainda há mortes nos países em desenvolvimento, principalmente. Além disso, há danos a fazendas, gado, casas, estradas. É bem possível sobreviver à tempestade apenas para viver nas piores condições.

Cientistas estão explorando maneiras de prevenir desastres naturais, desde incêndios florestais a enchentes e tempestades de granizo. Então, por que não os ciclones?

Tufões atingem as Filipinas regularmente, com impacto constante na economia e nos meios de subsistência. Imagem da capital, Manila, inundada após um ciclone em julho de 2023. Francis Malasig/EPA

É possível reduzir um ciclone a uma tempestade normal? Certamente é possível. Mas não é fácil.

Na década de 1960, os Estados Unidos exploraram a técnica chamada semeadura de nuvens, conhecida como chuva artificial, para prevenir que furacões se formassem. Durante o projeto Stormfury, aviões sobrevoavam os ciclones no mar e os pulverizavam com iodeto de prata, um produto químico que poderia agrupar as gotículas de água para caírem como chuva. De acordo com a teoria, isso impediria a formação do ciclone. Algumas tentativas chegaram a parecer correlacionadas com tufões mais brandos, mas a ligação nunca ficou provada e o projeto foi abandonado.

Agora, pesquisadores estão explorando duas novas opções.

Um balde de água fria

Furacões precisam de superfícies marítimas quentes para se formar. Se pudéssemos esfriar a superfície – por exemplo, canalizando água gelada de profundidades abaixo de 200 metros – poderíamos evitar a formação do ciclone.

O problema é que custa caro. Na estimativa da OceanTherm, uma startup norueguesa que se dedica ao tema, seriam necessários cerca de US$500 milhões de dólares somente para desenvolver a tecnologia e outros US$100 milhões por ano de manutenção.

E o pior é que diminuir a temperatura de uma área do mar não impede que ciclones surjam em outro lugar. Estudos sugerem que esfriar o oceano poderia, na melhor das hipóteses, apenas enfraquecer os furacões.

Areia no olho

Há uma opção mais provável: a injeção de aerossol. A ciência já sabe que a poeira no vento do deserto do Saara rumo ao Atlântico reduz a formação de ciclones. Poderíamos usar aviões ou drones para injetar partículas higroscópicas (que atraem água) na baixa atmosfera para refletir e espalhar a luz do sol, o que provocaria chuvas, atenuando a energia.

Esse método tem um pedigree científico mais forte, uma vez que já ocorre naturalmente. Mas não sabemos quais seriam os efeitos colaterais e ainda não temos certeza do que acontece com a energia redistribuída pela intervenção.

Outras pesquisas descobriram que os aerossóis poderiam reduzir a intensidade dos ciclones e, ao mesmo tempo, aumentar a precipitação nas bordas externas rotativas dos tufões. Porém, a chuva mais intensa ainda pode causar danos substanciais.

Como era de se esperar, é mais fácil e mais eficaz intervir no início da vida de um ciclone, antes que muita energia se acumule. Tentar deter um furacão implica tomar decisões cedo. Isso é um desafio, pois quanto mais tempo passa, mais o planeta esquenta, mais fortes os furacões ficam.

A difícil política das políticas públicas

Missões para controlar ciclones podem evocar a imagem de heróis em ação, salvando o mundo a la Hollywood.

Infelizmente, é mais complicado.

Digamos que o governo das Filipinas detecte a formação de um ciclone extremamente perigoso e decida interrompê-lo. Mas o calor não desaparece magicamente. Ele simplesmente se move. De repente, outra tempestade aparece, em direção à China, um país que, de repente, poderia culpar o vizinho de manipular o clima.

Exagero? Nem um pouco. Quando Fidel Castro soube do projeto Stormfury, ele temeu que fosse uma tentativa de transformar o clima em uma arma.

tropical storm dorothy
Pesquisadores do projeto Stormfury semearam a tempestade tropical Dorothy no leste do Caribe em 1970 e pensaram que dava certo. Mas esforços futuros não foram bem-sucedidos e a iniciativa foi abandonada. Wikimedia, CC BY

Em 2020, vizinhos da China alertaram sobre planos do Império Médio (significado de “china” em mandarim) de redirecionar um “rio do céu” atmosférico para as regiões secas do norte. Isso, de acordo com nações como a Índia, poderia retirar água de seus rios.

Então, quem decidiria como ou quando extinguir um ciclone? Como seria decidido? As empresas privadas deveriam ter permissão para realizar estudos de campo ou tais intervenções em larga escala deveriam ser exclusivas de governos? Quem seria responsável por quaisquer efeitos colaterais?

Há outras questões espinhosas. Se o controle de ciclones for aperfeiçoado, o que impediria um país de tentar redirecionar furacões para um rival? As tecnologias poderiam ser mal utilizadas, como temores semelhantes aos da geoengenharia em larga escala? E o mais importante, será que vale a pena assumir tantos riscos tecnológicos só para reduzir potenciais riscos de um tufão?

O que esperar do futuro dos furacões?

É urgente encontrar respostas para perguntas como essas. À medida que os ciclones se tornam mais fortes, precisamos de novos modelos globais de gestão e organismos para navegar as incertezas científicas, desenvolver recursos de monitoramento e saber tomar decisões colaborativas com rapidez. Não será fácil –a maioria dos acordos internacionais é lenta, e a maioria não atinge os objetivos firmados.

Tecnologias como a injeção de partículas são promissoras, mas não estão prontas para serem implantadas. Enquanto a tecnologia amadurece, as organizações também precisam amadurecer. Por isso estamos pesquisando a ciência e a política dessas intervenções. Ainda falta descobrir como e quando usar tais tecnologias antes que uma emergência as tornem necessárias.

This article was originally published in English

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