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Sapinho amarelo com manchas escuras sobre uma folha
Símbolos da biodiversidade das Américas Central e do Sul, os sapos-arlequim estão entre os anfíbios mais ameaçados de extinção. Samuel Gomides

Extinção de anfíbios: sapos-arlequim evidenciam a gravidade da situação

Quem vive em Manaus talvez já a tenha visto. Em seu pequeno corpo, tons de marrom, verde e amarelo se misturam num padrão multicolorido. A espécie Atelopus manauensis, descrita em 2020, é também conhecida como sapinho-manauara e é uma das 131 espécies conhecidas do gênero Atelopus – ou sapos-arlequim. Símbolos da biodiversidade das Américas Central e do Sul, os Atelopus são um dos grupos mais ameaçados da classe dos anfíbios.

Em um artigo do início de novembro publicado na Communications Earth & Environment, cem autores reuniram esforços para mapear o declínio populacional desses arlequins ambientais. A situação é crítica: nenhuma população das espécies do gênero aumentou, o que sugere que os esforços de conservação não estão indo muito bem. A destruição do meio ambiente, as mudanças climáticas e um fungo específico são os fatores por trás disso tudo.

Por que deveríamos nos importar? De acordo com outro trabalho de outubro de 2023 publicado na Nature, 40,7% das quase 9 mil espécies de anfíbios estão em grave perigo de extinção no mundo todo. Estamos falando de vertebrados como os sapos, as rãs, as salamandras e outros animais. Eles dependem de ambientes úmidos, passando parte da vida na água e parte no ambiente terrestre.

Adicionalmente, são muito sensíveis às mudanças da qualidade dos ambientes em que vivem e não toleram poluição. Por isso, a presença deles na natureza é vista como indicação de um ambiente saudável. Qualquer alteração pode fazer com que sumam.

Atelopus manauensis, conhecido como sapinho-manauara. PedroPeloso DOTS PP

Muitas espécies desapareceram desde 1980

A comunidade científica já vem notando o desaparecimento de muitas espécies desde 1980. Os sapos-arlequim são um dos grupos mais estudados de toda a classe de anfíbios e, justamente por isso, servem como um estudo de caso do que pode acontecer em um cenário crítico de extinção. Na pesquisa de novembro, duas bases de dados com informações sobre esse grupo foram analisadas. Uma de 2004, que já havia notado que 49 espécies estavam encolhendo em número, enquanto apenas dez se mantinham estáveis. E outra de 2022, para a qual os cem pesquisadores do artigo fizeram um esforço internacional para atualizar os dados até então disponíveis a partir de suas próprias pesquisas.

O Atelopus hoogmoedi é também conhecido como sapo-arlequim, uma das 131 espécies conhecidas do gênero Atelopus Samuel Gomides

Agora, 52 espécies estão desaparecendo, enquanto 14 seguem estáveis. As populações que mais encolhem estão distribuídas pelos Andes e na América Central. Apesar de as populações brasileiras serem consideradas estáveis, elas estão localizadas em uma zona considerada de fragilidade climática. Logo, as mudanças do clima podem causar prejuízos a elas no futuro próximo. O sapinho-manauara, por exemplo, vive em uma região de elevada ameaça devido ao desmatamento e à urbanização crescente.

Um dado razoavelmente positivo é que, nos últimos anos, cerca de 30 espécies que pensávamos estarem extintas foram redescobertas. Seis destas, no entanto, não foram vistas nos últimos dez anos. O contraponto é que as populações encontradas estão em uma densidade populacional inferior à original. Ou seja, as populações não estão se recuperando totalmente.

Espécies sofrem com infecção por fungo

Para completar, estima-se que, de 61 espécies de Atelopus não são encontradas na natureza desde 2004 ou antes, 37 delas estão provavelmente extintas, o que acende um sinal de alerta emergencial. A base de dados de 2022 também detalha os motivos para um cenário tão desolador. A perda de hábitat e o desmatamento são ameaças para 93 espécies, enquanto 50 estão sofrendo com a infecção do fungo Batrachochytrium dendrobatidis (Bd).

Este patógeno se espalha pela água e está atacando violentamente os anfíbios com uma doença conhecida como quitridiomicose. Ela é letal porque impede a correta troca gasosa da pele com o meio externo, além da troca de água e eletrólitos. Como eles respiram pelos pulmões e por via cutânea, o quadro final da doença ocasiona parada cardíaca. Alguns estudos sugerem que perturbações climáticas podem exacerbar os efeitos devastadores do Bd.

Sapinho-manauara. PedroPeloso DOTS PP

Nos últimos anos, diversos pesquisadores vêm trabalhando em conjunto em projetos de conservação, como a Iniciativa de Sobrevivência Atelopus, que reúne internacionalmente cientistas, técnicos e moradores locais para incentivar o rastreio das populações dos sapos-arlequim. Trata-se de um esforço colaborativo, com um plano de ação para o compartilhamento de informações, a busca de financiamento e a implementação de estratégias para salvar esses animais.

Se para esse grupo bastante estudado as notícias não são animadoras, imagine o que outras espécies menos conhecidas ou que ainda nem foram descritas formalmente estão passando. O momento de agir é imediato. Salvar os anfíbios é garantir a proteção de todo o ecossistema em que vivem, é preservar essas joias das florestas tropicais e também garantir um planeta para as futuras gerações.

O trabalho na Communications Earth & Environment foi liderado por Stefan Lötters e Amadeus Plewnia, ambos da Universidade de Trier. No Brasil, assinam também Kleiton R. Alves-Silva (Universidade Federal do Pará - UFPA), Marvin Anganoy-Criollo (Universidade de São Paulo - USP), Miguel Trefaut Rodrigues (USP), Youszef Oliveira da Cunha Bitar (UFPA) e Rafael F. Jorge (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

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