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Belas imagens como essa, das raras Iguanas Jamaicanas fotografadas pelo fotojornalista escocês Robin Moore, ajudaram a impedir a construção de um porto que poderia provocar a extinção da espécie. Esse e outros exemplos demostram a importância da fotografia na conservação da vida selvagem. Robin Moore, CC BY

Fotografia selvagem: beleza, reflexão e, às vezes, bons resultados na defesa da natureza

Em 2014, a então primeira-ministra jamaicana, Portia Simpson-Miller, iniciou negociações com a China Harbour Engineering Company para construir um porto na Great Goat Island, uma pequena ilha localizada na costa da Jamaica. A construção desse porto traria graves consequências ambientais, incluindo a ameaça de extinção da iguana jamaicana, uma espécie já vulnerável.

Essa iguana, apesar de sua aparência assustadora para muitas pessoas, é extremamente sensível. A espécie já esteve à beira da extinção por conta de diversas ameaças, como a caça e a predação por cães selvagens, gatos e porcos. A destruição de seu habitat para a produção de carvão piorou ainda mais essa situação. A construção do porto na Great Goat Island seria o golpe final, acabando com a última esperança de salvar a iguana jamaicana.

Diversos alertas, relatórios e cartas a respeito do impacto que a obra causaria foram entregues às autoridades e os envolvidos na obra.

Porém, foram as fotos do jovem e premiado fotógrafo escocês Robin Moore, colaborador de algumas das revistas científicas mais prestigiadas do mundo e diretor da Global Wildlife Conservation, que ajudaram a mudar o futuro da Iguana Jamaicana.

Experiente em publicações dedicadas à conservação da vida selvagem, Moore utilizou imagens e vídeos que captou na Jamaica para mobilizar a opinião pública contra a construção do porto.

Isso incluiu campanhas de cartões-postais enviados para o mundo inteiro. Na lista de remetentes estava a própria primeira-ministra Simpson-Miller, que havia iniciado o projeto de construção do malfadado porto. E ela se sensibilizou.

Ao obter a simpatia da líder política do país para sua causa, Moore conseguiu que sua história ganhasse cobertura em grandes veículos internacionais, como o The Guardian e o The New York Times.

Após dois anos e meio de campanha intensa, auxiliada por grupos locais e pelo Jamaican Environment Trust, o governo do país decidiu oficialmente não construir o porto na área protegida, garantindo a sobrevivência da iguana em seu habitat.

A história de sucesso da iguana jamaicana demonstra o poder que a fotografia de vida selvagem ainda tem para sensibilizar a sociedade - e eventualmente convencer o poder público - em prol da proteção da natureza.

Outro exemplo significativo e recente disso é o trabalho de Steve Winter, que documentou a exploração de tigres cativos nos Estados Unidos, em 2013. Suas fotografias, publicadas na National Geographic, expuseram as condições deploráveis em que alguns desses animais eram mantidos, provocando uma reação pública e política imediata.

A indignação gerada pelas imagens levou à aprovação do Big Cat Public Safety Act, uma lei que controla o comércio de grandes felinos em cativeiro nos EUA. Esse marco legal demonstra como a fotografia pode influenciar mudanças sociais e legislativas significativas.

Da mesma forma, Suzi Eszterhas, uma renomada fotógrafa de vida selvagem, também tem contribuído significativamente para a conservação através de suas imagens.

Especializada em filhotes de animais, Suzi fotografou preguiças no Santuário de Preguiças na Costa Rica, fortalecendo sua dedicação à conservação. Junto com a pesquisadora Becky Cliffe, ela ajudou a fundar a Sloth Conservation Foundation. As fotografias de Suzi aumentaram a conscientização sobre as ameaças enfrentadas pelas preguiças e arrecadaram fundos substanciais para a fundação.

Imagens da vida selvagem nos fazem refletir sobre como, quando, onde e por que os animais agem como agem. O genoma humano é 98% similar ao de bonobos e chimpanzés, mas nossa cultura e a capacidade de pensamento nos diferenciam muito de nossos parentes símios.

Um leopardo no meio de uma passada enquanto atravessa graciosamente um riacho, passando de uma rocha para outra. Os arredores são exuberantes com vegetação, realçando o ambiente selvagem e natural do cenário. A pelagem do leopardo é marcada com manchas distintas.
O fotógrafo de natureza Shashwat Harish, do Quênia, tem sua paciência recompensada por um momento de intimidade com um leopardo.

Como o cientista e filósofo Judea Pearl ilustra em seu livro “The Book of Why”, a maioria dos animais, assim como os computadores de IA atuais, aprende por associação, o que representa o primeiro degrau do aprendizado humano.

Os utilizadores de ferramentas, como os primeiros humanos, atingem o segundo degrau ao agir por planejamento, e não apenas por imitação. Além disso, aprendemos os efeitos das intervenções através de experiências, da mesma forma que os bebês adquirem grande parte de seu conhecimento causal.

No terceiro e último degrau temos os aprendizes contrafactuais, que são capazes de imaginar mundos alternativos e inferir razões para os fenômenos observados.

Essa capacidade de refletir sobre diferentes possibilidades e entender contextos complexos também se aplica à nossa percepção visual. Assim como o árbitro de vídeo no futebol (VAR) permite que vejamos detalhes que passaram despercebidos durante a velocidade do jogo, as fotografias de vida selvagem nos fazem refletir calmamente sobre críticas questões ambientais.

Ao olharmos uma imagem repetidamente, percebemos novos detalhes e significados que não eram evidentes à primeira vista. Esse processo de observação atenta pode nos ajudar a entender melhor os contextos e as implicações das questões que estamos observando, assim como o VAR ajuda a esclarecer lances controversos.

Foto subaquática de três hipopótamos parados no chão arenoso de um rio ou lago com iluminação azul. O hipopótamo maior está parcialmente obscurecido atrás do menor, ambos parecendo calmos e serenos, pois estão parcialmente submersos em águas ligeiramente turvas. Apenas a cabeça do terceiro filhote aparece de relance ao fundo.
O fotógrafo russo Mike Korostelev revela um hipopótamo e seus dois filhotes descansando sob a água.

As questões ambientais e de mudança climática são, fundamentalmente, questões de ciência. No entanto, para causar um impacto significativo na opinião pública e nas decisões políticas, é essencial aliar a ciência com a comunicação científica.

Dados e projeções numéricas, por si só, muitas vezes não conseguem mobilizar ações concretas. Foi o que vimos durante a pandemia e nas enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul. A visualização desses dados através de imagens pode criar uma conexão emocional e uma compreensão mais profunda do problema, levando a uma ação mais eficaz.

Nesse contexto, a 59ª edição da exposição do prêmio Wildlife Photographer of the Year (Fotógrafo de Vida Selvagem do Ano), que está no Brasil, traz uma oportunidade única para promover essa conexão entre a conservação da natureza e a arte. A exposição começou no dia 28 de maio e vai até 25 de agosto, na Galeria Marta Traba, no Memorial da América Latina, em São Paulo, e tem entrada gratuita. As fotos que ilustram este artigo estão entre as obras da exposição.

Em uma sociedade onde os vídeos estão cada vez mais curtos e a atenção é cada vez mais fragmentada, exposições fotográficas nos convidam a refletir com calma e um pouco mais de profundidade sobre o mundo. Com mais tempo para pensar e, eventualmente, tomar decisões que possam contribuir para um futuro melhor.

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