Menu Close

Texto, áudio ou vídeo: saiba com qual aprendemos melhor

Pessoa vestindo máscara lê um livro na praça
Quando o foco mental e a reflexão são necessários, é hora de abrir um livro. Noam Galai/Getty Images

Durante a pandemia, o papel perdeu ainda mais espaço para a nuvem. Ensinar e aprender ficou multimídia, o material didático e as tarefas migraram dos livros para as telas em variados formatos e plataformas digitais.

Como professora acadêmica de Linguística, tenho investigado como a comunicação eletrônica se compara à analógica na qualidade do aprendizado. A compreensão é a mesma se uma pessoa lê um texto na tela ou no papel? E quanto à audição e à visualização de um material? São modalidades tão eficazes quanto a leitura do mesmo conteúdo?

A resposta para tais perguntas costuma ser “não”. É o que discuto em meu livro “How We Read Now” (Como lemos agora), lançado em 2021. A explicação envolve uma combinação de fatores que incluem a concentração reduzida, uma mentalidade de entretenimento e a tendência multitarefa ao consumir conteúdo digital.

Ler no papel vs. ler na tela

Uma série de pesquisas confirma que absorvemos melhor a informação em centenas de palavras de textos impressos do que digitais. Os benefícios de ler no papel são particularmente evidentes quando passamos de tarefas simples, como identificar a mensagem principal de um determinado trecho, para tarefas que exigem reflexão, como captar e interpretar as entrelinhas.

A leitura tradicional também aumenta a probabilidade de lembrar detalhes, como a cor do cabelo de um personagem ou o local e o momento dos eventos na história. Por exemplo, “o acidente foi antes ou depois do golpe político?”.

Estudos mostram que tanto os alunos em etapa escolar quanto os universitários de hoje pensam que terão notas mais altas em um teste de compreensão se leram o conteúdo em formato digital. Na prática, porém, a pontuação é maior quando o material lido antes da prova era impresso.

Os educadores precisam saber também que o método usado para testes padronizados pode afetar os resultados. Pesquisas com alunos de escola primária na Noruega e com alunos do ensino fundamental nos Estados Unidos relatam pontuações mais altas quando os testes padronizados são aplicados em papel. No estudo dos EUA, os efeitos negativos dos testes digitais foram mais fortes entre os estudantes com notas baixas em compreensão leitora, os que estão aprendendo inglês e os de educação especial.

No caso de uma pesquisa minha e outra de colegas, abordamos a questão de forma diferente. Em vez de pedir aos alunos que lessem e fizessem um teste, perguntamos como eles percebiam o seu aprendizado geral quando liam materiais impressos ou digitais. Tanto os alunos do ensino médio quanto os universitários consideraram que a leitura em papel era melhor para a concentração, a aprendizagem e a memorização do que a digital.

As discrepâncias entre os resultados impressos e digitais estão parcialmente relacionadas às propriedades físicas do papel. Com o papel, há uma disposição necessária das mãos, assim como uma percepção geográfica e visual distinta das páginas. As pessoas costumam vincular a memória do que leram à parte do livro onde pararam ou ao parágrafo na página.

Mas igualmente importante é a perspectiva mental e o que pesquisadores chamam de “hipótese superficial”. De acordo com essa teoria, as pessoas consomem textos digitais com uma predisposição ao entretenimento, como se estivessem interagindo com redes sociais, isto é, de maneira mais desprendida, dedicando menos esforço mental do que quando leem textos impressos.

Estudantes trabalham em laptops na biblioteca de uma escola americana
Os alunos ficam mais propensos a multitarefas e distrações quando estudam nas telas. Erin Clark/The Boston Globe via Getty Images

Podcasts e vídeos

Enquanto a adaptação à aprendizagem virtual na pandemia popularizou o modelo de aulas invertidas –nas quais os alunos ouvem ou assistem o conteúdo antes do encontro com o professor–, a internet já oferecia uma infinidade de podcasts e vídeos sobre qualquer tema. Nesse contexto, muitas tarefas escolares que anteriormente envolviam leitura foram substituídas por audição ou visualização.

Pesquisando o corpo docente de universidades estadunidenses e norueguesas em 2019, a professora Anne Mangen, da Universidade de Stavanger, e eu descobrimos que 32% dos professores dos EUA já vinham substituindo materiais em texto por vídeos, e 15% relataram fazer o mesmo com áudio. Os números foram um pouco menores na Noruega. Em ambos países, porém, 40% dos entrevistados que haviam alterado seus programas de curso nos últimos cinco a 10 anos informaram que estão atribuindo menos leituras atualmente.

Um dos principais motivos dessa transição para áudio e vídeo é que os alunos não fazem as tarefas com a leitura designada. Embora o problema não seja novo, um estudo realizado em 2015 com mais de 18.000 universitários no último ano de faculdade constatou que apenas 21% costumava concluir todas as leituras obrigatórias para o curso.

E como áudio e vídeo podem parecer mais atrativos do que texto, professores recorrem cada vez mais a essas tecnologias –por exemplo, designar uma palestra TED em vez de um artigo escrito pela mesma pessoa.

Não perca o foco

Psicólogos demonstraram que os adultos lembram mais de um conteúdo quando leem notícias ou transcrições de vídeo, do que quando ouvem ou assistem peças idênticas. Resultados semelhantes foram encontrados entre universitários ao ler um artigo e ouvir um podcast do texto. Outro estudo relacionado confirma que os alunos vagueiam mais pela mente quando ouvem áudio do que quando leem.

Estudantes menores apresentaram semelhanças e uma diferença. Uma pesquisa realizada no Chipre concluiu que a relação entre as habilidades de escuta e leitura se inverte à medida que as crianças se tornam leitoras mais fluentes. Enquanto os alunos da segunda série tiveram melhor compreensão ao ouvir, os da oitava, ao contrário, compreenderam melhor ao ler.

A comparação de aprendizado entre vídeo e texto reflete os resultados com áudio. Na Espanha, por exemplo, pesquisadores descobriram que alunos da quarta à sexta série que liam textos demonstravam uma integração mental muito maior do material do que aqueles que assistiam vídeos. A hipótese dos autores é que os alunos absorvem o conteúdo dos vídeos mais superficialmente porque associam o formato com entretenimento, e não com aprendizagem.

De maneira geral, a ciência mostra como a mídia digital manifesta características comuns quanto aos hábitos de uso que podem restringir o aprendizado. Entre elas, uma concentração menor, a predisposição ao entretenimento, a propensão a realizar várias tarefas ao mesmo tempo, a falta de um ponto de referência físico, a redução de anotações e de revisão do conteúdo absorvido, haja sido lido, ouvido ou visto.

Textos on-line, áudios e vídeos têm funções educacionais, especialmente quando fornecem recursos indisponíveis no papel. No entanto, a capacidade de aprender requer esforço mental, foco e reflexão. Portanto, educadores –e pais– não devem presumir que a compreensão e o desenvolvimento dos estudantes será igual em qualquer formato, mesmo quando contêm palavras idênticas.

This article was originally published in English

Want to write?

Write an article and join a growing community of more than 182,900 academics and researchers from 4,948 institutions.

Register now