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Ilustração de uma explosão de raios gama
Ilustração de uma explosão de raios gama, com jatos de material e radiação sendo ejetados pelo colapso de uma estrela maciça: estudo indica que fenômenos não podem ser responsáveis pela síntese de átomos pesados que vemos no Universo. Nasa/Swift/Cruz deWilde

As maiores explosões do Universo não são suficientes para explicar todos átomos pesados que vemos

Após seu “nascimento” no Big Bang, o Universo consistia basicamente de hidrogênio e alguns átomos de hélio. Esses são os elementos mais leves da tabela periódica. Mais ou menos todos os elementos mais pesados que o hélio foram produzidos nos 13,8 bilhões de anos entre o Big Bang e os dias atuais.

As estrelas produziram muitos desses elementos mais pesados por meio do processo de fusão nuclear. Entretanto, este processo só produz elementos tão pesados quanto o ferro. A criação de qualquer elemento mais pesado consumiria energia em vez de liberá-la.

Para explicar a presença desses elementos mais pesados atualmente, é necessário encontrar fenômenos que possam produzi-los. Um tipo de evento que se encaixa nesse perfil é uma explosão de raios gama (GRB, na sigle em inglês) - o tipo de explosão mais poderosa do Universo. Estas explosões podem irromper com um quintilhão (10 seguido de 18 zeros) de vezes a luminosidade do nosso Sol, e acredita-se que sejam causadas por vários tipos de eventos.

As GRBs podem ser subdivididas em duas categorias: explosões longas e explosões curtas. As GRBs longas estão associadas à morte de estrelas maciças e de rotação rápida. De acordo com essa teoria, o material dos feixes de rotação rápida é ejetado durante o colapso de uma estrela maciça em jatos estreitos que se movem em velocidades extremamente rápidas.

Espelhos do JWST
O Telescópio Espacial James Webb observou as consequências da ‘BOAT’ Emmett Given/Nasa/MSFC

Já as rajadas curtas duram apenas alguns segundos. Acredita-se que elas sejam causadas pela colisão de duas estrelas de nêutrons - estrelas “mortas” extremamente compactadas e densas. Em agosto de 2017, um evento importante ajudou a apoiar essa teoria. O Ligo e o Virgo, dois detectores de ondas gravitacionais nos Estados Unidos, descobriram um sinal que parecia vir de duas estrelas de nêutrons encaminhando-se para uma colisão.

Alguns segundos depois, uma curta explosão de raios gama, conhecida como GRB 100817A, foi detectada vindo da mesma direção no céu. Durante algumas semanas, praticamente todos os telescópios do planeta estavam apontando para esse evento em um esforço sem precedentes para estudar suas consequências.

As observações revelaram uma quilonova no local da GRB 170817A. Uma quilonova é uma prima mais fraca da explosão de uma supernova. O mais interessante é que houve evidências de que muitos elementos pesados foram produzidos durante a explosão. Os autores de um estudo na Nature que analisou a explosão mostraram que essa quilonova parecia produzir duas categorias diferentes de detritos, ou materiais ejetados. Uma era composta principalmente de elementos leves, enquanto a outra era composta de elementos pesados.

Já mencionamos que a fusão nuclear só pode produzir, de forma viável, elementos tão pesados quanto o ferro na tabela periódica. Mas há outro processo que poderia explicar como a quilonova foi capaz de produzir elementos ainda mais pesados.

O chamado processo de captura rápida de nêutrons (rapid neutron-capture process), ou processo r, é aquele em que o núcleo (ou núcleos) de elementos mais pesados, como o ferro, capturam muitos nêutrons em um curto espaço de tempo. Em seguida, eles crescem rapidamente em massa, produzindo elementos muito mais pesados. Para que o processo r funcione, no entanto, são necessárias as condições certas: alta densidade, alta temperatura e um grande número de nêutrons livres disponíveis. As explosões de raios gama fornecem essas condições necessárias.

Entretanto, as fusões de duas estrelas de nêutrons, como a que causou a quilonova GRB 170817A, são eventos muito raros. De fato, elas podem ser tão raras que se tornam uma fonte improvável para os elementos pesados abundantes que temos no Universo. Mas o que dizer dos GRBs longos?

GRB artist impression
Um jato de partículas é ejetado de uma estrela quando ela entra em colapso em um buraco negro. Nasa Goddard Space Flight Center

Um estudo recente investigou uma explosão de raios gama longa em particular, a GRB 221009. Essa explosão foi apelidada de BOAT - a mais brilhante de todos os tempos. Essa GRB foi detectada como um pulso de intensa radiação que varreu o Sistema Solar em 9 de outubro de 2022.

A BOAT provocou uma campanha de observação astronômica semelhante à da quilonova. Essa GRB foi 10 vezes mais energética do que a recordista anterior e tão próxima de nós que sua influência na atmosfera da Terra foi mensurável no solo e comparável a uma grande tempestade solar.

Entre os telescópios que estudaram as consequências da BOAT estava o Telescópio Espacial James Webb (JWST). Ele observou a GRB cerca de seis meses após sua explosão, de modo a não ficar cego pelo brilho residual da explosão inicial. Os dados coletados pelo JWST mostraram que, apesar do brilho extraordinário do evento, ele foi causado por uma explosão de supernova meramente mediana.

De fato, observações anteriores de outras GRBs longas indicaram que não há correlação entre o brilho da GRB e o tamanho da explosão de supernova associada a ele. A BOAT parece não ser exceção.

A equipe do JWST também inferiu o número de elementos pesados produzidos durante a explosão da BOAT. Eles não encontraram nenhuma indicação de elementos produzidos pelo processo r. Isso é surpreendente, pois, teoricamente, acredita-se que o brilho de uma GRB longa esteja associado às condições em seu núcleo, provavelmente um buraco negro. Para eventos muito brilhantes - especialmente um tão extremo como a BOAT - as condições devem ser adequadas para que o processo r ocorra.

Essas descobertas sugerem que as explosões de raios gama podem não ser a esperada fonte crucial dos elementos pesados do Universo. Em vez disso, deve haver uma fonte ou fontes existentes ainda desconhecidas.

This article was originally published in English

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