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Futebol, samba, praia e pouca seriedade continuam sendo as principais percepções sobre o Brasil mesmo entre a comunidade política das principais nações. AP Photo/Silvia Izquierdo

Estereótipos e preconceitos ofuscam imagem internacional do Brasil

As primeiras décadas do século XXI registraram um claro aumento do interesse internacional sobre o Brasil, quando se consolidou uma narrativa sobre a ascensão do país no contexto global, que estava alinhada a sua aspiração histórica de alcançar o status de grande potência. Este trabalho de projeção do país, entretanto, esbarra em um persistente desconhecimento externo em relação ao Brasil, e a imagens superficiais e estereotipadas que persistem no imaginário estrangeiro. O nível de conhecimento internacional sobre o Brasil ainda é muito limitado, mesmo entre as elites de nações poderosas. A percepção da comunidade de política externa das potências estabelecidas é que o Brasil é amplamente desconhecido no exterior. O país é mal compreendido, e suas imagens são marcadas por clichês.

Estes são alguns dos resultados de um estudo sobre o status internacional do Brasil a partir da percepção da comunidade de política externa das grandes potências. Ele acaba de ser discutido no artigo científico It’s always sunny in Brazil – Images, stereotypes, ignorance, and the country’s international status, desenvolvido com base em minha pesquisa de doutorado pelo King’s College London (em parceria com a USP) e publicado pela revista acadêmica Opinião Pública.

O trabalho analisa as percepções sobre o país mantidas pelas elites que compõem a comunidade de política externa dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas: Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China. Ele foi desenvolvido a partir de 94 entrevistas com diplomatas, acadêmicos, políticos, jornalistas e outros profissionais envolvidos com a política externa dessas nações. Além de uma avaliação mais ampla sobre o status do país, os dados serviram para revelar esta imagem do país marcada pela superficialidade e pelo desconhecimento.

Esta avaliação é importante porque contrasta com a aspiração tradicional do país de ampliar seu prestígio internacional. Historicamente, o Brasil quer se tornar uma grande potência, mas estudos sobre status em relações internacionais determinam que, para ter alto prestígio, um país precisa ser reconhecido como tal pelas potências estabelecidas. O status de um país depende não apenas do que ele quer, mas de como ele é percebido pelas grandes potências, e cada país tem o status que outras nações reconhecem que ele tem. Portanto, além do potencial real do Brasil e de seus atributos formais de poder (que não são negligenciáveis), seu nível de prestígio depende da imagem que ele tem entre as nações mais poderosas do mundo.

Alguns estudos baseados em pesquisas de opinião pública em diferentes países já haviam apontado que o Brasil não é visto de fora como sendo um país sério, e que é percebido como “decorativo”, sendo associado a estereótipos não geralmente aplicados a países importantes na política global. O diferencial do artigo apresentado aqui é que ele vai além das populações gerais dos países e se concentra nas percepções de indivíduos que ajudam a definir a política dos Estados mais poderosos do mundo. Seu objetivo é avaliar qual é a imagem do Brasil na perspectiva dessas nações poderosas para compreender as difíceis barreiras que o país deve superar para avançar em suas aspirações de se tornar um ator importante na política global.

Ilustre desconhecido

A percepção da comunidade de política externa das grandes potências é que o Brasil ainda é um país amplamente desconhecido e incompreendido, mesmo entre as elites e formuladores de políticas de algumas das nações mais poderosas do mundo. A ideia de que a imagem do Brasil se esconde por trás de uma parede de clichês foi um dos assuntos mais frequentes na análise de entrevistas com esta comunidade das grandes potências.

“O Brasil é um país desconhecido” foi um dos temas mais prevalentes desenvolvidos a partir da análise dos dados. Isso revela que a comunidade de política externa das grandes potências acredita que há uma ignorância geral sobre o Brasil dentro dessas nações, que a população geral em seus países sabe muito pouco sobre o Brasil e pensa apenas em termos de clichês superficiais.

Ao mesmo tempo, estereótipos e compreensão superficial também predominam entre políticos e especialistas que supostamente deveriam pensar em diplomacia e participar de decisões políticas que influenciam as relações dessas nações poderosas com o Brasil, segundo os entrevistados. Essas pessoas que tomam decisões sobre negociações internacionais envolvendo o Brasil também não conhecem o país tão bem.

Isso pode dificultar uma compreensão mais aprofundada sobre o país e limitar o conhecimento sobre as reais capacidades e atributos de poder do país, o que, por sua vez, pode dificultar o aumento do nível de prestígio do Brasil.

Terra dos clichês

Quando questionados sobre o que lhes vem à mente quando pensam no Brasil e instados a descrever suas visões sobre a imagem do Brasil em suas próprias nações, os entrevistados associaram o país a clichês superficiais e ligados à ideia do país como um lugar de festas e turismo.

A análise dos dados mostra que esta percepção está alinhada com o que as pesquisas com o público em geral revelam sobre as imagens do Brasil e que, mesmo quando as imagens são positivas, elas podem não apoiar a reivindicação do país por um status mais elevado.

As imagens mais citadas pelos entrevistados ao discutir as percepções sobre o Brasil foram futebol, carnaval e samba, natureza e a Amazônia, praias, corrupção, violência e criminalidade, música, tamanho do país, simpatia, felicidade, turismo, distância, cultura, novelas, exotismo, Rio de Janeiro, Lula, povo divertido, café, mulheres e sensualidade.

Mapa temático sobre a imagem do Brasil desenvolvido a partir da análise de entrevistas com a comunidade de política externa das grandes potências.

É importante salientar que as imagens mais proeminentes sobre o Brasil costumam ser positivas, mas costumam estar relacionadas à ideia de que é um lugar ensolarado, com grande beleza natural, maravilhoso para férias, lazer e esportes, com muitas praias, música, festas, felicidade e sensualidade. No entanto, quando aspectos mais sérios de economia e política foram mencionados, eles eram principalmente com conotações negativas, focando em corrupção, subdesenvolvimento, pobreza e violência.

Em resumo, as imagens do Brasil tanto entre a população geral quanto entre as elites políticas e de relações internacionais são clichês que revelam ignorância e um preconceito generalizado que pode dificultar os esforços do Brasil para aumentar seu status.

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