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Pesquisa: Correr ou fazer yoga vencem a depressão, mesmo que exercício físico seja a última coisa que você queira fazer

Pelo menos uma em cada dez pessoas tem depressão em algum momento de suas vidas, com algumas estimativas apontando para uma em cada quatro pessoas. Depressão representa um dos maiores riscos para o bem-estar individual das pessoas: pior do que dívidas, divórcio ou diabetes.

Dados do último mapeamento sobre a doença realizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 2021) apontam que mais de 11 milhões de brasileiros (5.8% da população) sofre de depressão. Além disso, um levantamento epidemiológico conduzido pelo Ministério da Saúde revelou que nos próximos anos até 15,5% da população brasileira pode sofrer depressão ao menos uma vez ao longo da vida.

No Brasil, a comercialização de antidepressivos e estabilizadores de humor cresce a cada ano. Dados do Conselho Federal de Farmácia apontam que, entre os anos de 2017 e 2021, a venda desses medicamentos cresceu quase 60%, evidenciando a alta e crescente prevalência desse transtorno na população brasileira.

A demanda por psicólogos é igualmente alta. No entanto, um relatório publicado em 2023 pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) apontou que apenas 2 em cada 10 pessoas (20%) com problemas graves de saúde mental têm acesso ao tratamento necessário. Mesmo em países de alta renda, apenas metade das pessoas com depressão recebem o tratamento adequado.

Nossa pesquisa ressalta a importância de incorporar o exercício físico como parte integrante do tratamento, juntamente com terapia e antidepressivos. Descobrimos que exercícios físicos podem ser tão eficazes no tratamento da depressão quanto a terapia, por exemplo, dependendo do tipo de exercício e da forma como é realizado.

Ande, corra, faça treinamento de força, ou dance para longe da depressão

Encontramos 218 ensaios clínicos randomizados sobre o efeito do exercício físico no tratamento da depressão, com 14.170 participantes. Empregamos um método sofisticado conhecido como meta-análise de rede para examinar esses dados. Essa abordagem nos permitiu avaliar comparativamente diferentes modalidades de exercício, em vez de agrupá-las indiscriminadamente.

Os resultados revelaram que atividades como caminhada, corrida, treinamento de força, yoga e exercícios aeróbicos demonstraram eficácia comparável à terapia cognitivo-comportamental - considerada padrão ouro no tratamento da depressão. Estas modalidades de exercício mostraram-se não apenas mais eficazes do que antidepressivos isoladamente, mas também comparáveis à eficácia do exercício em conjunto com medicamentos antidepressivos. Além disso, treinamento de força e yoga despontaram como as atividades com maior aderência por parte dos participantes.

Os efeitos da dança também foram muito poderosos, embora nossa conclusão tenha se baseado em um número reduzido de estudos, em sua maioria envolvendo mulheres jovens. Para os demais tipos de exercícios, o número de evidências foi mais significativo, o que dá maior respaldo aos resultados.

Os antidepressivos certamente ajudam algumas pessoas a combater a depressão. E, claro, qualquer pessoa em tratamento para depressão deve conversar com seu médico antes de fazer qualquer alteração no que foi inicialmente prescrito.

Entretanto, nossas evidências mostram que se você tem depressão, você deve procurar tratamento psicológico e aderir a um plano de exercícios personalizado e seguro (elaborado por um profissional de educação fisica), independentemente de você estar ou não tomando antidepressivos.

Comece um programa de exercício e se dedique (de preferência acompanhado)

Antes de analisarmos os dados deste estudo, pensávamos que pessoas com depressão talvez precisassem praticar exercícios físicos sempre com muita moderação, atendendo a conselhos genéricos como: “qualquer atividade física é melhor do que nenhuma”.

No entanto, descobrimos que um programa de exercícios que visa desafiar os seus limites, pelo menos um pouco, pode ser muito mais eficaz. Sendo assim, programas de exercícios com estrutura clara e objetivos bem definidos funcionam melhor em comparação àqueles que oferecem muita liberdade às pessoas.

Exercitar-se sozinho também pode dificultar a escolha do nível de intensidade do exercício, visto que a baixa autoestima é um sintoma da depressão. Ou seja, pessoas com baixa autoestima tendem a se subestimar e realizar os exercícios em uma intensidade muito aquém de suas capacidades físicas. Por isso é importante ter alguém por perto pra te incentivar e te dar suporte durante seus momentos de prática, seja este alguém um profissional de Educação Física, seu (sua) parceiro(a), um amigo, ou um familiar.

Também constatamos que não importa o quanto as pessoas se exercitem, em termos de sessões ou minutos de treino por semana, ou duração do programa de exercícios físicos. O que importa é a intensidade do exercício realizado; quanto maior a intensidade, melhores são os resultados sobre os sintomas depressivos.

Sim, é difícil manter-se motivado

Devemos ter cautela ao interpretar esses resultados. Ao contrário do que acontece em ensaios clínicos com medicamentos, participantes de intervenções à base de exercícios físicos sabem qual “tratamento” foram aleatoriamente designados a receber, o que pode distorcer os resultados.

Muitas pessoas com depressão enfrentam barreiras físicas, psicológicas ou sociais para participar de programas formais de exercícios. E obter apoio para se exercitar não é algo que acontece gratuitamente.

Ainda não sabemos qual é a melhor maneira de manter a motivação para se exercitar, o que pode ser ainda mais difícil se você tiver depressão. Tentamos descobrir, por exemplo, de que forma o estabelecimento de metas de exercícios pode ajudar as pessoas a manterem-se motivadas. Infelizmente, não conseguimos obter um resultado muito claro.

Outras análises descobriram que é importante ter um plano de exercícios bem definido (por exemplo, agendar o exercício em seu calendário) e monitorar seu progresso (por exemplo, usando um aplicativo ou smartwatch). Entretanto, prever quais dessas intervenções funcionam melhor é uma tarefa difícil.

Um estudo realizado em 2021 com mais de 60.000 frequentadores de academias de ginástica descobriu que até mesmo especialistas nesta área não conseguem prever quais estratégias podem fazer as pessoas irem à academia com mais frequência. Nem mesmo tornar os treinos mais divertidos pareceu motivar as pessoas. Ouvir audiobooks durante o exercício (algo que nenhum especialista previu), no entanto, apresentou-se como uma estratégia muito eficiente.

Ainda assim, podemos ter confiança de que as pessoas se beneficiam do apoio personalizado e da responsabilidade. O apoio ajuda a superar os obstáculos que certamente surgirão. A responsabilidade mantém as pessoas em movimento mesmo quando seus cérebros dizem para evitá-lo.

Portanto, ao iniciar um plano de exercício, evite fazer isso sozinho. Em vez disso: » junte-se a um grupo de exercícios, grupo de dança, estúdio de yoga, entre outros » contrate um personal trainer ou um fisiologista do exercício » peça a um amigo ou familiar para fazer uma caminhada com você.

Dar alguns passos em direção a obter esse apoio aumenta as chances de você continuar se exercitando por mais tempo.


Read more: Exercise is even more effective than counselling or medication for depression. But how much do you need?


Vamos oficializar isso? Exercícios físicos como elemento essential no tratamento contra depressão

Em alguns países, o exercício físico é considerado uma opção secundária no tratamento da depressão. Por exemplo, a Associação Americana de Psicologia (American Psychological Association) recomenda o exercício físico apenas condicionalmente, ou seja, como um “tratamento alternativo” apenas quando a psicoterapia ou a farmacoterapia forem ineficazes ou inaceitáveis. Esta abordagem pode resultar na privação de muitas pessoas de um tratamento altamente eficaz, mesmo quando este é mais acessível à população em geral.

Por outro lado, o Colegio Real de Psiquiatras da Austrália e Nova Zelândia (Royal Australian and New Zealand College of Psychiatrists) recomenda que todas as pessoas com depressão realizem atividade aeróbica vigorosa pelo menos duas a três vezes por semana.

Dada a alta prevalência de depressão no mundo, e o elevado número de pessoas que não recebem cuidados, é crucial que os sistemas de saúde em todo o mundo, incluindo o Brasil, sigam este exemplo. É preciso integrar os exercícios físicos como parte complementar e essencial do plano de tratamento para a depressão, sejam este terapêutico ou medicamentoso.

Uma abordagem mais holística sobre esse fenômeno pode oferecer uma resposta mais abrangente e eficaz ao desafio global da depressão.

Gostaríamos de agradecer aos demais autores do artigo no qual este texto se baseia.

Se este artigo despertou algumas questões em você ou se você está preocupado com alguém que conhece que possa estar demonstrando comportamentos depressivos, procure ajuda profissional.

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