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Andrew Michael/Alamy Stock Photo

Psitacose: o que já sabemos sobre a febre dos papagaios e o misterioso surto de pneumonia na Argentina

O termo “pneumonia misteriosa” desperta um gatilho desde o início de 2020. Foi assim que a doença ainda não nomeada COVID-19 foi descrita pela primeira vez quando um grupo de casos foi identificado em Wuhan, China.

Esse termo está sendo usado novamente para descrever um grupo de casos de pneumonia “atípica” em Buenos Aires, na Argentina. Alguns casos de psitacose, também conhecida como “febre do papagaio”, foram confirmados nesse grupo. Antes de começar a estocar papel higiênico e máscaras ou de levar seu papagaio de volta ao pet shop, deixe-me explicar o que sabemos e o que não sabemos sobre esse novo surto. Isso pode lhe poupar algum dinheiro e preocupações.

A psitacose, ou febre do papagaio, é causada por uma bactéria chamada Chlamydia psittaci e é uma infecção comum em aves. Geralmente é transmitida do animal para o ser humano por meio do contato próximo com aves, inclusive papagaios e calopsitas, e também aves domésticas, como patos e perus.

A bactéria pode ser encontrada nas fezes e em outras excreções. Portanto, as pessoas com maior risco incluem veterinários, funcionários de pet shops ou aqueles que possuem aves.

A psitacose geralmente é leve, mas pode se tornar uma infecção grave, especialmente em pessoas vulneráveis, como idosos ou pessoas com sistema imunológico fraco.

O surto na Argentina foi relatado pela primeira vez em 17 de abril de 2024 no ProMED, um site amplamente utilizado para relatar surtos de doenças infecciosas em todo o mundo. A breve postagem destacava a ocorrência de cerca de 60 casos de pneumonia “atípica” nos 30 dias anteriores, muitos deles em pessoas mais jovens e vários deles exigindo hospitalização e cuidados críticos.

O relatório enviado ao ProMED sugere que 20 casos apresentaram evidências de psitacose, sendo que dez deles foram confirmados como positivos por testes laboratoriais. Muitos desses casos não tiveram nenhum contato óbvio com aves. A fonte do conteúdo também é desconhecida - descrita apenas como “um indivíduo conhecido do ProMED”.

A psitacose é incomum, mas não desconhecida. O governo do Reino Unido indica que há cerca de 25 a 50 casos registrados na Inglaterra e no País de Gales a cada ano.

Uma revisão sistemática de 2017 concluiu que cerca de 1% dos casos de pneumonia não adquiridos em um hospital podem ser resultado de psitacose. Um relatório da Organização Mundial da Saúde, datado de 5 de março de 2024, descreve dezenas de casos humanos em vários países europeus, com cinco mortes.

A orientação da OMS inclui quarentena, lavagem frequente das mãos, incentivo às pessoas com pássaros de estimação para que mantenham as gaiolas limpas, posicionamento das gaiolas de modo que as fezes não se espalhem entre elas e para evitar a superlotação.

Um estudo australiano associou um risco maior de psitacose ao corte do gramado sem o uso de um coletor de grama. É possível que o cortador de grama tenha passado por cima e “aerossolizado” algumas fezes infectadas que foram posteriormente inaladas.

Uma pessoa cortando a grama sem um coletor de grama.
Cortar a grama sem um coletor de grama pode lançar pedaços ‘aerossolizados’ de cocô de pássaro infectado. Tretyakov Viktor/Shutterstock

Então, qual é a gravidade desse surto na Argentina e qual é o grau de preocupação que o mundo todo deve ter? Com frequência, ocorrem surtos locais de doenças infecciosas respiratórias, que podem causar pneumonia grave, e esses surtos não se espalham de forma mais ampla ou internacionalmente. A COVID foi a exceção, e não a regra.

No momento em que este artigo foi escrito, havia muito poucas informações disponíveis sobre o surto na Argentina. Não houve nenhuma declaração das autoridades de saúde pública da Argentina, nem da OMS Organização Pan-Americana da Saúde.

Entre as principais informações que realmente precisaríamos saber está a probabilidade de transmissão entre humanos. Por exemplo, se uma investigação concluir que todos os casos ocorreram no mesmo local de trabalho, onde, possivelmente, eles podem ter sido expostos a fezes de aves infectadas, então, muito provavelmente, houve uma única fonte de infecção. Isso torna a resposta da saúde pública mais direta, com menos implicações para a população em geral.

Se (hipoteticamente) a epidemiologia nos disser que um cenário provável seria o de múltiplos casos de transmissão de psitacose de pessoa para pessoa, isso seria muito mais preocupante.

Um artigo que investigou um surto de 2020 na China concluiu que os dados do estudo podem “representar o primeiro relato documentado de transmissão de C. psittaci entre humanos na China”. Mas isso é raro, e atualmente não há evidências claras disso na Argentina.

Em sua conclusão do relatório de situação sobre o surto de psitacose na Europa em 2024, a OMS concluiu que não há “nenhuma indicação de que essa doença esteja sendo disseminada por seres humanos em nível nacional ou internacional” e que, com base nas informações disponíveis, os riscos “representados por esse evento são baixos”.

Seria razoável aplicar um pensamento semelhante ao surto da Argentina. No entanto, são necessárias mais informações para chegar a conclusões adequadas.

A psitacose é uma das muitas infecções que podem representar um risco à saúde humana em circunstâncias específicas. Mas não há nenhuma indicação de que a “febre do papagaio” será a próxima grande novidade. Isso mostra a importância da vigilância e da notificação de surtos em todas as partes do mundo, com dados epidemiológicos e laboratoriais em tempo real sendo disponibilizados para fornecer informações públicas atualizadas.

This article was originally published in English

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