Menu Close
Centro de monitoramento do Cemaden, em São José dos Campos: sistema de alerta para desastres naturais é composto por quatro eixos: conhecimento do risco, monitoramento, comunicação e capacidade de resposta. Luara Baggi / MCTI

Sistemas de alerta são fundamentais para mitigar os impactos de eventos extremos

Em 2011, inundações, enxurradas e deslizamentos atingiram sete municípios da região serrana do Rio de Janeiro, no que foi, até aquele momento, a maior catástrofe de origem climática do Brasil. Naquele momento país não tinha um sistema nacional de alerta desenvolvido, de modo que aquele desastre levou à criação do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e de um plano nacional alinhado às atividades de Centro.

Nos anos seguintes, o Brasil avançou muito em sistemas de alerta: investiu-se muito nessa ponta, mas pouco se investiu na prevenção dos desastres, com a preservação de ecossistemas, cuidado com as populações vulneráveis ou criação de infraestruturas capazes de mitigar os impactos. Por isso, os sistemas de alerta enfrentam um desafio gigantesco em momentos como o das cheias recentes no Rio Grande do Sul.

Sistemas de alerta: quatro eixos para mitigar impactos

O Cemaden fica em São José dos Campos, em São Paulo, de onde monitoramos mais de 1.100 municípios. Mas, à distância, só conseguimos ver parte do problema, por isso é tão importante que nossa atuação se dê em conjunto com os sistemas de alerta estaduais e municipais, que estão na ponta e vão lidar diretamente a situação com o problema real de seus territórios.

Um sistema de alerta de desastres naturais é composto por quatro eixos: o conhecimento do risco, o monitoramento, a comunicação e a capacidade de resposta.

O primeiro é o conhecimento dos riscos, que passa pelo mapeamento das áreas de risco, caracterização da população exposta, identificação de limiares críticos de precipitação que levam a inundações e deslizamentos. Essas questões são muito específicas nos diferentes territórios do país, e os alertas precisam considerar essas especificidades. Quanto mais conhecemos os riscos, melhor é nossa noção do problema, o que nos permite calibrar melhor nossas tomadas de decisão.

O segundo eixo é o monitoramento, que é o foco central do Cemaden, onde ele é feito 24 horas por dia, sete dias por semana de forma ininterrupta desde sua criação. Na Sala de Situação do Cemaden analisamos uma série de informações, computando a probabilidade de certos eventos acontecerem, e o impacto que esses eventos causariam nesses diferentes territórios, sempre considerando suas particularidades. Essa análise é o que chamamos de análise de risco.

É a partir dessas análises de probabilidade e impacto que saem os níveis de alerta, que vão comunicar os níveis de contingenciamento esperado das defesas civis. Um alerta moderado, alto ou muito alto define o que se espera da defesa civil daquele município, dadas as evidências que temos naquele instante.

Com um alerta moderado, não se espera uma catástrofe, mas vale a prontidão. A defesa civil já pode avisar algumas comunidades mais críticas sobre os possíveis impactos. No nível alto, a defesa civil já pode tomar medidas mais vigorosas, como começar a chamar um efetivo maior, realizar vistorias, e preparar alguns abrigos. No muito alto, a situação é realmente mais drástica, e já se espera que seja feita evacuação, retirando pessoas das áreas de risco, e que já se tenham abrigos montados e ativação de rotas de fugas estabelecidas.

Essas ações concretas, capazes de mitigar os impactos dos desastres, têm que ser feitas na ponta, pelas defesas civis locais. E esse é um grande gargalo do sistema, porque muitas defesas municipais são extremamente fragilizadas: algumas só existem no papel, outras não têm sede própria, viatura, computador, efetivo, ou funcionários com experiência.

Essa é a realidade da maioria das defesas civis municipais no Brasil, inclusive no Rio Grande do Sul. Mas essas instituições precisam ser fortalecidas se esperamos que elas respondam com eficiência no caso da iminência de um desastre.

Os outros eixos - comunicação e capacidade de resposta - passam exatamente por essa necessidade de atuação na ponta. No que diz respeito à comunicação, no Cemaden fornecemos as análises técnicas para as defesas civis estaduais e municipais. Cabe a elas decidirem como vão comunicar isso para a população, por conta de uma série de complexidades que podem existir nesses territórios. E isso, no meu entendimento, é um dos grandes desafios das respostas aos desastres. Para tentar facilitar esse trabalho, temos revisado os protocolos nacionais, para torná-los mais objetivos, permitindo uma atuação mais rápida e eficiente na ponta.

Por fim, o último eixo de um sistema de alerta é a capacidade de resposta, que também passa pelas defesas civis. Estamos atualmente no processo de elaboração do Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil, que demorou cerca de 12 anos para ser feito, e deve ser implementado ainda este ano. No Plano, existe um capítulo que olha para as mudanças climáticas, a partir de resultados de projeções do clima futuro até 2040. Também está em discussão o Plano Clima-Adaptação, que trata das mudanças climáticas. Este tipo de abordagem, olhando para as mudanças climáticas, é extremamente importante para direcionarmos recursos e políticas públicas conforme as particularidades de cada localidade, especialmente aquelas onde o risco tende a ser exacerbado pela intensificação dos eventos extremos.

Uma questão política

Essas discussões nos planos em elaboração já são um primeiro passo, mas ainda estão longe do que precisamos para nos adaptarmos à nova realidade do planeta. Na ciência, as mudanças climáticas são um consenso, mas a ciência ainda está muito longe do âmbito técnico das decisões, e mesmo a discussão técnica ainda está longe das decisões políticas.

Para além da criação dos planos, é importante que eles venham acompanhados de legislações que os regulamentem e garantam seu cumprimento ao longo do tempo. Do contrário, corremos o risco de dependermos da boa vontade de políticos que estejam nos cargos, nos municípios ou estados.

E é aqui que nós, enquanto sociedade, podemos falhar mais uma vez. Os cidadãos precisam ficar atentos às consultas públicas e cobrar a execução desses planos quando chegar o momento, sem permitir que eles fiquem apenas no papel.

Mas só teremos essa participação cidadã plena quando houver investimentos e valorização da educação ambiental. No curto prazo, precisamos aumentar os cursos de pós-graduação e capacitações sobre as questões ambientais. Muito tem se falado sobre o assunto, mas poucas pessoas de fato entendem como usar todas essas informações: na prática, como faço um plano na minha cidade? Como desenvolver um projeto para minha região?

Precisamos também mudar a cultura da população. E isso se faz com as crianças, incluindo as questões ambientais no currículo básico, para que elas entendam como tudo está conectado e qual o seu papel no mundo. Ao longo do tempo, com mudanças nas gerações futuras, quem sabem consigamos mudar essa realidade?

Want to write?

Write an article and join a growing community of more than 185,900 academics and researchers from 4,984 institutions.

Register now